sexta-feira, 19 de novembro de 2010

2º dia de palestras sobre alimentos orgânicos na Livraria Cultura: "Gastronomia com orgânicos"

Antes de adentrar à palestra do 2º dia, informo, de antemão, que a do 3º dia foi a melhor de todas; na verdade, diria que a primeira foi um tapa na cara; a segunda foi legal, mas acho que se perdeu um pouco em vários momentos, mas a terceira e última foi a MELHOR; não deixem de lê-la - prometo postá-la em breve!


 
A palestra de quinta-feira, sob o tema “Gastronomia com orgânicos”, contou com a presença de três chefs que utilizam majoritária ou exclusivamente produtos orgânicos, e contaram um pouco sobre o porquê de tomarem essa atitude, os desafios e as recompensas.

O primeiro a falar foi José Barattino, chef do restaurante Emiliano, que inicia a sua explanação pelos motivos de usar orgânicos na sua cozinha; o primeiro é o respeito que entende ser devido aos que produzem os alimentos; o segundo, para ele, é bastante óbvio, uma vez que o foco da sua cozinha é o sabor, que está diretamente ligado à qualidade do alimento, e nesse ponto os orgânicos são imensamente superiores, pois, na sua opinião, o fato de respeitar a sua sazionalidade proporciona a apreciação de um alimento que nasce e é colhido no seu melhor momento.

Tendo isso em mente, buscou aproximar-se dos produtores, e desenvolveu o projeto “sustentabilidade da cadeia de produção”, que visa aproximar o consumidor do fornecedor, e vice e versa, pois descobriu que estes também têm muitos problemas para alcançar o seu público. Além disso, visa o desenvolvimento de novos produtos e de outros, hoje esquecidos.

Terminou sua explanação afirmando que o chef tem de defender a boa alimentação e a qualidade dos ingredientes.


Após, o microfone foi passado para Leila D., especializada em alimentação orgânica e viva, consultora do 1º mercado de produtos orgânicos, a Galeria Orgânica,  e promotora do 1.º Festival de Gastronomia Orgânica de SP, que será realizado nos dias 22 a 26 de vovembro, no Mercadão. Para quem se interessou pela Galeria Orgânica, há também uma reportagem sobre o mesmo aqui

Leila iniciou esclarecendo que faz uma gastronomia sustentável, trabalha com orgânicos há 10 anos, e tenta demonstrar, por meio da sua arte, que existem outras opções para uma gastronomia gourmet além dessa que estamos tão acostumados, e tudo isso sendo  vegetariana, trabalhando com alimentos vivos, funcionais,  e elaborando pratos para os intolerantes à lactose e ao glúten.

Entende que a pessoa tem de pensar em cuidar de si antes de querer salvar o mundo, e nesse ponto diz que os orgânicos são fundamentais. Voltando ao tema de que o preço não é o real empecilho, já que muitos gastam muito mais com inúmeras outras coisas, inclusive com medicamentos, faz uma crítica por não entender como é possível possuirmos um território fértil e imenso, que tem produzido orgânicos e exportado, por falta de mercado consumidor interno. Sustenta a possibilidade de um preço mais acessível, e da sustentabilidade em se consumir esses produtos, o que é, a seu ver, um resgate a uma vida mais verdadeira, ao encontro da família à mesa no lugar de se comer em frente ao computador. Entende, por fim, a necessidade desse retorno às origens como um alerta, uma forma de repensar, de se informar de sair do lugar comum da alimentação processada, de aproveitar o alimento como um todo, e todos os alimentos, cada um na sua época.

Finaliza lembrando-se do tempo em que viveu no Japão, e conta que lá o cozinheiro é a maior profissão, pois eles entendem que este pode matar ou dar vida a uma pessoa; e ela acredita piamente no velho ditado “você é o que você come”.


O último a falar foi Renato Caleffi, chef e proprietário do Le Manjue Bistrô, restaurante não apenas orgânico, mas com opções para a maioria das restrições alimentares, como vegetarianos, celíacos ou com intolerância à lactose, com enfoque, inclusive, à funcionalidade dos pratos, o que significa, em apertada síntese, pensar nas melhores combinações visando a absorção dos nutrientes.

Abordou uma série de benefícios que vão desde o aspecto sócio-ambiental, que garante a permanência das pessoas no campo de uma forma digna, com um manejo sustentável do meio e a observação das leis trabalhistas, ao aspecto sensorial, já que é um alimento mais fresco, com mais cor e odor, além de ser mais seguro, por ter menor teor de água, o que significa menor durabilidade, justamente o contrário do que muitos pensam.

O orgânico é manipulado da mesma forma, , mas você deve atentar a outros aspectos, como embalagem desse alimento, panela em que será cozido; do contrário é trocar seis por meia dúzia.

Fez uma série de perguntas, como “carne orgânica é carne de soja?”; “orgânico é sinônimo de vegetarianismo?”; “toda comida orgânica é light?”; “toda comida funcional tem de ser orgânica?”; “quem consome orgânico é natureba?”; “precisa ser tudo integral? Para responder a essas perguntas, ele nos mostrou inúmeras fotos dos pratos que prepara no seu restaurante. Expõe sobre o ranço sobre termos como “natureba”, designado por alguns ao lerem determinador ingredientes; diz que é mais natural por não dispor um katchup industrial, mas preparar uma geléia de tomate.  Para os celíacos, por exemplo, ele propõe a quinoa como substituta do couscous. Ele diz que não anuncia todos os benefícios, ou todos os ingredientes, como no caso da farinha de banana,  pois tem medo de ser rotulado como natureba, termo este, segundo o chef, muito controverso, pois um suco de fruta não orgânica pode ser dito natural, assim como peito de peru em uma salada, que de natural não tem nada.

Não sei se pelo fato dele ser advogado e ter passado a trabalhar nessa área, pelo seu pensamento global e totalmente coerente, ou pela delicadeza e dedicação com que prepara os seus pratos, mas estou louca para visitar o restaurante e provar as suas criações orgânicas!
 

Findas as explanações, a mediadora abriu para perguntas da platéia.

1. Como foi essa mudança em relação ao aspecto dos orgânicos, antes ditos feios e machucados e hoje mais bonitos e vistosos; pode-se confiar em montar um cardápio totalmente orgânico?
O chef Renato explicou sobre o aspecto dos alimentos, dizendo que isso varia de fornecedor para fornecedor, da expertise de cada um, e que o chef tem de ser adaptar a isso, e esclareceu que o mais difícil e mais caro é encontrar especiarias.

Quanto à montagem de um cardápio orgânico, complementando o que o Renato dizia, sobre a necessidade de uma boa logística e vários fornecedores, Leia relembrou o tempo em que tinha um restaurante, e que, muitas vezes, tinha de ir pessoalmente atrás dos alimentos, esclareceu que é muito mais trabalhoso do que ir à CEAGESP. Ressalta, outrossim, que a criação do cardápio tem muito a ver com isso, pois o produto não estará disponível o ano todo; as pessoas precisam repensar a natureza, as épocas do ano, a sazionalidade.

O chef Barattino finalisa essa questão explicando que a solução para a sazionalidade foi generaliza o nome dos pratos renomados; ele não descreve o prato exato no menu, apenas “verduras”, grãos”, e no dia o atendente esclarece ao cliente o que será servido, especificamente, nesse dia.  Ressalta que 80% das verduras que utiliza são orgânicas, assim como 50-60% dos legumes e 30% das frutas; explica que isso se dá tanto pelo fato de que há pratos muito conhecidos, com muita saída, como por exemplo um com mandioquinha, e obviamente quando ele não encontra essa orgânica, compra a convencional; além disso, especificamente com relação às frutas, a dificuldade é bem maior, pois transformar uma horta de alface em orgânica é bem diferente de transformar um pomar em orgânico.

Questionado sobre preço, ouviu-se uma surpreendente revelação do chef Barattino ao esclarecer que possui, no restaurante, uma variação de preço mensal de 10%, na compra dos hortifrutis, e que tem meses em que fica mais barato comprar orgânicos, quando determinados produtos estão no seu auge, com grande produção e preço baixo. Ressalta, entretanto, que ele não possui intermediários; o caminhão sai da fazenda direto para o restaurante.

2. Quais hábitos no conduzem ao estado pleno da alma?
Chef Leila aborda o tema da maior quantidade de nutrientes dos orgânicos e fala sobre os alimentos vivos, usando o exemplo do grão que se coloca de molho durante a noite, que começa a germinar, elimina toxinas e ganha enzimas; entende de cada um tem de descobrir qual a melhor dieta, tanto do ponto de vista físico quanto psíquico, ressaltando que o alimento vivo proporciona uma maior cognição. Cita Ana Branco, do Rio de Janeiro, que aborda o tema do biochip e da modificação das células.

3. Já que os peixes não fazem parte das certificadoras, como comprá-los?
O chef Barattino esclarece que, mais do que certificados, ele busca o contato real com os fornecedores; no caso dos peixes, parte deles é convencional, como o bacalhau, e parte vem de Parati, de uma comunidade de pescadores. Ressalta a dificuldade em se comprar peixes, independentemente da origem, pois nosso litoral é pobre e não há respeito nesse ramo; cita o exemplo de pessoas que, frente a uma provável falta de frutos do mar, compra-os de qualquer forma para estocá-los para os meses futuros.

Questiona sobre a necessidade da educação do consumidor para tanto, pois se este entender que não pode comer camarão o ano todo, os restaurantes não precisarão comprá-los, e se permite que o fruto do mar tenha o seu tempo para crescer e se reproduzir, ao contrário da pesca irracional que estamos tendo.

4. Onde estão os nós da cadeia produtiva dos orgânicos?
O chef Barattino inicia a resposta relembrando os três pilares da cadeia, o produtor o produto e o consumidor, e que, no seu trabalho, procurou facilitar essa integração, aproximar a fazenda da cozinha, e abordar o tema com o consumidor, no salão do restaurante.

Questionado sobre o grande público, ressalta que iniciou o trabalho com o Pupin, da Família Orgânica, em janeiro desse ano, e em março eles começaram a entregar também em algumas casas; isso iniciou-se porque o chef percebeu que eles poderiam aproveitar a viagem e hoje eles conseguem atender muitas residências. Em resposta a uma pergunta da platéia, que questionava sobre uma possível timidez e falta de organização dos produtores, ressalta a necessidade dessa ligação com eles, de um entendimento sobre a vida dos produtores, que trabalham com poucas pessoas, tem o diz certo para receber os pedidos e se organizar; eles não podem fazer quando nos queremos que ele faça. Nós temos de mudar a nossa cultura de querer ligar hoje para receber amanhã; temos de entender o lado deles.

O chef Renato, que utiliza produtos 100% orgânicos ressalta que pratica o “exercício da paciência”; conta que por vezes um dos seus fornecedores estará gripado ou terá quebrado a perna e não poderá lhe levar a encomenda ou fabricar determinada coisa. Reafirma a necessidade de se entender que o ritmo é outro que não o de São Paulo, mas um ritmo adequado, em um nível mais elevado.

5. É possível fazer bolo vivo a menos de 42º?
O chef Renato afirmou que sim e ressaltou o uso do desidratador, mas passou o microfone para a chef Leila, especialista no tema, que informou sobre cursos de comida viva, inclusive para o Natal. É possível se trabalhar com castanhas, amêndoas para montar uma base, com frutas frescas e secas. Por fim o chef Renato passou a receita de uma mousse de cacau viva que colocou em seu cardápio, feita com manga, abacate e cacau batidos no processador, com mel ou outra fruta hidratada para adoçar.

6. Como comer só alimentos crus e fazer essa conversão para a alta gastronomia?
A chef Leila contou sobre cursos disponíveis nos EUA, onde ela entrou em contato com a matéria; hoje se inspira em pratos tradicionais e faz muitas experiências, com grãos germinados e castanhas, mas ressalta que trabalhar com cru não é algo fácil, pois é um alimento rústico.

7. Como resposta a um pedido de receita, a chef Leila indica o suco verde, feito a base de folha de couve, hortelã, maçã e um grão germinado, ressaltando que a quinoa e a linhaça germinam rapidamente, durante a noite. Molho branco alternativo de quinoa com manjericão ou alho poró.

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